Com eles
contactamos pela primeira vez e vivemos as fases que nos definem enquanto
humanos.
Como falamos
num outro texto, Lev Wygotsky, um aludido estudioso sobre a psicologia infantil,
acredita que graças ao facto da criança ser um ser relacional, esta irá
adquirir muitas caraterísticas e comportamentos através da relação interpessoal.
Será de esperar, portanto, que as primeiras relações com os pais sejam
determinantes na influência das nossas personalidades.
Não é
habitual vermos um “miúdo” mimado a agir como um “miúdo” abandonado. Ambos
tiveram relações interpessoais distintas.
Estudiosos
apontam que após os anos 60, criou-se uma onda de liberalismo que se arrastou
para os dias de hoje. Os pais em vez de executarem o papel de educador que lhe
está pré-destinado, preferem ser os melhores amigos. E ao invés de
estabelecerem regras para os seus filhos cumprirem, estes optam por um papel
bem mais liberal. Aliás em alguns casos, as figuras paternas tentam compensar a
rigidez a que foram submetidas enquanto crianças, com uma educação mais
“mimada”.
Comportamento
que considera negável, já que é esta liberdade educativa que forma jovens
desordeiros, sem a noção dos limites. Na opinião dele, a mudança de paradigma
deu-se de forma muito abrupta e se antes dos anos 60, os pais eram mais rígidos
e os filhos sucumbiam à sua autoridade, agora existe excesso de atenção que
culmina com um tratamento da criança digno de rei. Propõe uma nova mudança,
onde os pais consigam encontrar o balanço ideal entre rigidez e amizade, para
que nem a criança crie uma visão demasiadamente “dura” nem uma visão
demasiadamente “cor-de-rosa” da vida, tornando-se mais equilibrada.
Certamente
as nossas vivências com figuras paternas foram distintas umas das outras e vamos
usar este espaço para vos elucidar acerca das nossas experiências.
João
Sobre este tema a minha experiência diz-me que a influência dos meus
pais é bem grande no meu desenvolvimento.
Grande parte da minha infância foi vivida em casa. Nunca fui um rapaz
que procurava muita experiência exterior, aliás sentia um bocado de repulsa em
ter que conviver com um grupo grande de pessoas durante muito tempo e a solução
passava por estar em casa a viver o meu mundo.
Sendo o primeiro de dois filhos, sem dúvida que tive uma maior proteção
por parte dos meus pais em relação à minha irmã, o que a meu ver é totalmente
compreensível. Aqui estão duas pessoas a serem pais pela primeira vez, sem
terem bem a noção do que fazer.
Ás vezes sentia-me tão bem em casa, que não via o mundo lá fora como
uma opção. Nunca a frase “se estás a ganhar, não mudas” encaixou tão bem. Um
dia na escola corria menos bem, ia para casa e ficava tudo bem. Lembro-me
muitas vezes de me sentir muito tranquilo na cozinha enquanto via a minha mãe
cozinhar (atividade que ela preza muito e que ela demonstra através de pratos
maravilhosos). Não precisava de ir longe para ter aquilo que precisava. Quando
sair da minha zona de conforto era a ordem do dia, ia com o meu Pai. Tinha uma
confiança inabalável nele e um respeito que apenas um grupo exclusivo de
pessoas merece. Todo o lugar onde ele ia, eu ia, simples.
Claro que também tivemos os nossos confrontos. Esse geralmente
acabavam com ele a tentar ensinar-me “boas maneiras”, enquanto eu corria
desenfreadamente pela casa. Quando me apanhava era um problema, mas olhando
agora para trás lembro-me desses momentos com um sorriso na cara. Exigência era
um conceito que o meu pai prezava e queria transmitir-me isso, mas eu teimava
em não perceber.
No entanto com o decorrer do tempo as coisas mudaram. Atravessei uma
grande crise de confiança que parece ter abalado a dinâmica da família. A minha
mãe preocupava-se demasiadamente comigo, enquanto o meu pai se afastou um
bocado. Provavelmente ele teria outras situações que o afetavam, que ele não
gostava de revelar e preferia interiorizar. A verdade é que me ressenti um
bocado da sua ausência, a nível emocional, e tentei procurar maneira de me
defender. Nunca consegui e acabei mesmo por desistir. Lembro-me mesmo de chegar
a casa, depois de uma sequência de dias difíceis na escola e não ter vontade de
me levantar da cama. Os anos em que senti o distanciamento do meu pai, foram os
piores minha vida.
Ao longo do tempo, o espaçamento foi aumentando e houve alturas em que
eu e o meu pai vivíamos na mesma casa, mas eu nem me importava com isso, porque
já não o via como uma figura paterna. Mais uma vez eu amo-o muito, mas houve
uma desconeção emocional durante um largo período de tempo.
A puberdade não ajudou e depois do afastamento do meu pai, sucedeu-se
o afastamento emocional da minha mãe. Eu sentia-me mesmo só e como tal
procurava responder com indiferença.
Durou alguns anos mas a fase acabou por passar, nós crescemos e
percebemos que não vivemos sozinhos no mundo. As pessoas tem os seus problemas
e apesar de ter tido uns pais extraordinários na primeira fase da minha vida,
eu cheguei mesmo a sentir que eles tinham desaparecido. Nada disto é culpa
deles, provavelmente eu estava mal habituado. Provavelmente vivia demasiado
protegido do mundo. Provavelmente não me expus tanto e isso teve determinados
efeitos. Agora tudo isso é passado e a vida continua.
Atualmente, posso revelar que as respetivas relações estão bem
melhores. O facto de estar mais maduro e perceber que a “luta da vida” é dura,
faz-me perceber que eles também são seres-humanos e também tiveram, tem e irão
ter dificuldades para enfrentar alguns obstáculos. Afinal de contas “se soubéssemos
melhor, faríamos melhor”.
Pedro
São chatos, intolerantes e antiquados, mas têm um dom de saber o que
devemos fazer e acabamos sempre por confirmar que tinham, no fundo do fundo,
razão para nos terem chateado daquela maneira.
Toda a criança necessita, obrigatoriamente, de alguém que lhe
transmita um caminho para a educação e para a sua formação como ser humano.
Ora, sempre que o caminho é desviado e os comportamentos não são os adequados é
de esperar a correção de volta ao caminho certo, esta deverá ser feita pelos
pais da criança.
Ora, na minha opinião, os problemas entre pais e filhos residem em
saber como fazer uma correta retificação do caminho. Primeiro, deve ser dada um
explicação coerente, pois o “porque eu digo” tem muito pouco de educativo.
Segundo, a forma como se fala deve ser adequada, isto porque os erros fazem
parte da formação e reagir agressivamente só trará animosidade à relação
pais/filhos. Optar pelo diálogo deve ser sempre a medida tomada, pois o papel
dos pais deve ser formar uma boa pessoa e não alguém com receio de se exprimir.
Tiago
Não me posso queixar da minha educação. Apesar de viver apenas com a
minha mãe e com o meu irmão. Nunca me faltou nada. Tive sempre o apoio do resto
da família que ajudava a mim e ao meu irmão. Claro que por causa da minha mãe
ser a minha única figura de autoridade, por vezes, chateava-me com ela sem
razão nos momentos em que apenas ela podia chamar-me à atenção. Mas sem dúvida
que tenho uma grande relação com ela.
Para além do ensino regular, a minha mãe permitiu-me fazer atividades
extra, como estudar música e praticar desporto, que foi bastante importante
para o meu desenvolvimento. Consegui experimentar muitas coisas e perceber o
que realmente gosto e aquilo que não gosto. A minha mãe sempre me deu bastante
liberdade, contudo ela também sabia gerir um meio-termo e quando tinha de ser
autoritária ela era capaz de o ser nos momentos certos.
Ela também ensinou que para ser pai ou mãe, realmente basta ter muito
amor e muita vontade. Por isso se eu tive uma infância normal, sem problemas e
cresci em volta de uma figura feminina, não vejo por que razões algumas pessoas
são contra a adoção de crianças por parte de casais homossexuais. As crianças
precisam de amor, apenas isso. Não é por ser um casal homossexual que elas vão
ter um desenvolvimento anormal em relação a outras crianças e de futuro terão
tendência a ser homossexuais. E se o forem, não podemos considerar um problema,
visto que não devemos ser preconceituosos, pois a homossexualidade é uma
escolha e não uma doença. Independentemente se o casal é homossexual,
heterossexual, se é apenas um pai, uma mãe, avós, ou tios, o que uma criança
precisa apenas é amor e conforto.
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