sexta-feira, 22 de abril de 2016

Entrada na Universidade

Hoje, o nosso tema tem como propósito  abordar a entrada na universidade e a nossa respectiva adaptação. Sem dúvida, que existe uma grande transição do ensino secundário para o ensino superior que normalmente traz consigo grandes alterações às nossas vidas peculiares de adolescentes. É exactamente nesta altura que grande parte dos adolescentes começam a procurar a sua autonomia e a decidir o futuro.
Segundo Erikson, 1976 “Em primeiro lugar, ela representa muitas vezes a primeira tentativa importante de implementar um senso de identidade autónoma, tentativa esta traduzida por meio da escolha profissional (ou tentativa de escolha), que é uma tarefa típica do desenvolvimento na passagem da adolescência para a vida adulta.”
Temos também como objectivo relacionar a temática de hoje, com a perspectiva da Psicologia. Perceber a razão pela escolha do curso, como os estudantes lidam com a pressão social em relação à entrada na universidade, adaptação a um novo modo de vida, perspectivas em relação ao futuro e a praxe.


Começando por perceber a razão pela qual a escolha de um curso de desporto, segundo  estudos dentro desta temática realizados em Portugal por Israel (2000), este concluiu que no seu estudo, realizado junto de alunos da Licenciatura em Desporto e Educação Física da Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física da Universidade do Porto, que a principal razão para a escolha do curso e da profissão docente, inerente ao curso, não é a vocação mas sim outros factores como a “vontade de adquirir novos conhecimentos e a projecção social e económica de tirar um curso superior”. O facto de trabalhar junto de jovens e contribuir para o desenvolvimento destes, é outro dos factores indicado preferencialmente para justificar a escolha desta profissão. De realçar que ao contrário de outros estudos realizados no âmbito da escolha da profissão docente, os alunos não demonstraram ter escolhido a profissão de docente de Educação Física como alternativa ao não ingresso noutra vertente profissional.
Semelhantes foram as observações de Carreiro da Costa, et al (1994), junto de um universo de 106 alunos do 1º ao 5º ano de uma licenciatura de educação física, onde há a destacar:
  • O gosto e interesse pela prática de actividade física é o factor maioritariamente indicado para a escolha do curso;
  •  Apenas 41,5% deseja desempenhar de forma exclusiva a profissão de professor;
  • 26,4% desejam ocupar a função de treinador e 28,3% a função de treinador e professor.
  • Só os alunos a frequentar o 5º ano é que assinalam o seu desejo de virem a ser professores.
Para além da motivação, outro factor interessante que interessa estudar à psicologia é a adaptação e a rotina universitária. Segundo um estudo realizado na Universidade do Minho – “Transição e adaptação à Universidade : apresentação do Questionário de Vivências Académicas (QVA)”, realizado por: Almeida, Leandro S. , Soares, Ana Paula e Ferreira, Joaquim Armando G., tomando uma amostra de 1273 alunos do 1º ano de 41 licenciaturas da Universidade do Minho. Conclui-se que esta transição confronta o jovem com a resolução simultânea conjunto de tarefas em 4 domínios principais:
  • Académico – o ensino universitário requer novos ritmos e estratégias de aprendizagem, face aos novos sistemas de ensino e de avaliação.
  • Social – a experiência universitária requer o desenvolvimento de padrões de relacionamento interpessoal mais maduros na relação com a família, com os professores e colegas, com o sexo oposto e com as figuras de autoridade.
  • Pessoal – os anos universitários devem concorrer para o estabelecimento de um forte sentido de identidade, para o desenvolvimento da auto-estima, de um maior conhecimento de si próprio/a e para o desenvolvimento de uma visão pessoal do mundo.
  • Vocacional/ Institucional – a universidade constitui uma etapa fundamental para o desenvolvimento de uma entidade vocacional, onde a especificação, a implementação e o comprometimento com determinados objectivos vocacionais e/ou institucionais parecem assumir particular importância.
Ou seja, a entrada na universidade constitui um ano recheado de desafios que acaba por leva ao excessivo stress e natural ansiedade dos jovens. E este mesmo momento ainda é mais marcante, ocorrendo em Portugal, devido à tradição da Praxe.

A Praxe académica tem tido, ao longo dos anos, associada a si o papel chave na integração dos estudantes recém-chegados ao contexto universitário. Esse papel deve passar por assegurar uma resposta positiva à adaptação equitativa a todos os estudantes, podendo ser percepcionada como uma entidade de suporte social. Daí, quando a Praxe assume uma postura menos igualitária,menos acolhedora, mais violenta e causadora de incómodo, embaraço ou dor, dá-se a quebra do laço estabelecido entre o estudante e uma primeira tentativa de integração à instituição, ao curso, aos costumes aos novos colegas de curso. Torna-se necessária a devida responsabilização dos envolventes, a disponibilização de apoio a quem é afectado e a promoção das boas práticas praxistas. Em Dias e Sá (2013), numa investigação com estudantes portugueses, encontra-se que cerca de um terço dos inquiridos indicou o medo da praxe como o elemento mais nefasto da entrada no Ensino Superior. Também em Silva (2013), igualmente com estudantes portugueses, observa a existência de estudantes que apontam a praxe como contendo situações humilhantes, com carater obrigatório e que se prolongam no tempo. A afronta, a humilhação e a violência a que os recém-entrados podem ser expostos, por vezes, são tomados como excessos pontuais dos “doutores”, quando o comportamento destes, incentivado pressão social do grupo que praxa e estimulado pelo medo de represálias e isolamento sentido pelo caloiro que é praxado, ultrapassa as regras de conduta do código da praxe. Por isso mesmo, a entrada para o ensino superior é capaz de causar ansiedade a qualquer estudante, pois na situação em que vai para uma faculdade, não conhecendo e quase ninguém ou mesmo ninguém, é o único meio socialmente aceite como meio de integração é a praxe. E ele deve tomar a decisão de fazer ou não parte dela.


Tiago

Foi sem dúvida uma altura marcante da minha vida em diversos aspectos. Felizmente já sabia o curso que queria ingressar, apesar de não saber se ia atingir a média desejada. A  área do desporto, em especial a gestão e organização de eventos desportivos, foi sempre algo que me fascinou e gostaria de trabalhar. Outro factor que penso que foi decisório na sustentação da minha escolha, foi o facto de ter feito um curso profissional de técnico de apoio à gestão desportiva. Essa experiência prévia foi bastante gratificante, porque me permitiu desde cedo começar a estudar e a ganhar real noção da área desportiva e do mundo do trabalho.
Depois de saber que tinha conseguido entrado na melhor faculdade da área no país, fiquei bastante satisfeito e feliz, contudo quando faltava cerca de uma semana entrei num grande estado de ansiedade e angústia.
Uma das razões devia-se ao facto de ter que deixar de jogar futebol, outra das minhas grandes paixões, depois tinha algum receio de começar a viver sozinho, sujeito a dividir a casa com estranhos. Outra das razões sem dúvida era o curso. “Serei capaz de conclui-lo?”; Aquilo que realmente quero é a gestão desportiva, contudo tenho bastantes disciplinas práticas às quais sei que vou ter de trabalhar bastante para poder passar. “Como irão ser os professores?”; ”Serão realmente os maus da fita como todos dizem?”; Por fim o que mais me preocupava era a vida académica e a praxe. Valorizando sempre os ideais de uma vida moderadamente saudável, não queria meter-me em excessos alcoólicos até entrar coma.  A praxe era algo que me intrigava-me porque toda gente falava: uns por ser a melhor coisa do mundo, outros porque são totalmente contra ela. Eu apartida já tinha a ideia de que a praxe não seria nada de especial e nem muito agradável, mas decidi dar uma oportunidade e não me deixar influenciar pela elevada dramatização da comunicação social.
A minha ideia confirmou-se, a praxe é algo que não faz qualquer sentido pois não concretiza aquilo a meu ver devia ser o seu propósito, a integração. Apesar da praxe da minha faculdade não poder ser comparada em relação à dimensão de muito outras faculdades, não era nada de especial. Era submetido a tarefas sem propósito, chamavam-nos nomes, obrigavam-nos a saber canções sem sentido, a gastar dinheiro em jantares em que todos os caloiros comem do mesmo prato e talheres.
Frequentei a praxe durante as 2 primeiras semanas, a última gota foi quando andamos pelo centro da cidade do Porto a ser humilhados, a olhar para o chão, a caminhar de gatas, fazer figuras ridículas, e pressionaram-nos a beber álcool, que normalmente vinham de copos que ninguém sabe de onde e o que tinha lá dentro, e a participar em jantares académicos. Caso respondêssemos que não pressionavam-nos psicologicamente para dar uma boa razão.  Mas o que realmente me fascina são as pessoas que dizem que ser praxado foi os melhores anos da sua vida e que a universidade “não é para fazer-se mas sim para se ir fazendo”. Chegam mesmo a defender ideais que são totalmente os contrários da universidade. Não consigo perceber como  pessoas que gostam de ser humilhadas e ser submetidas a tarefas ridículas sem propósito.
Na minha opinião a praxe deveria continuar a existir, mas seria melhor, se fosse apenas actividades organizadas, em parceria, com o conhecimento e regulamentação da faculdade em que estudantes referenciados pelo sucesso escolar ficariam com o cargo de mostrar os diversos espaços da faculdade, promover actividades para as pessoas conhecerem-se melhor, uns jogos desportivos (não  nada que um jogo colectivo não ponha as pessoas a interagir e a falar), visitas guiadas para conhecer verdadeiramente a história da cidade, para que possamos ver algo realmente de interessante que não seja apenas a calçada, e claro uns jantares agradáveis.
Na primeira semana, também estranhei o facto de viver sozinho e ter começado uma nova aventura na cozinha, procurando variar os pratos de massa, arroz, atum e salsichas. Na segunda semana, já dividia a casa com outra pessoa, que por sorte até era um tipo simpático, viria a ser meu colega de faculdade e fazer parte do Psicologia a 3, o meu caro colega de Braga, João Pinto.
Já a relação com os docentes foi muita estranha desde quando me fui inscrever e uma mulher que mal me cumprimentou, pôs me num computador a carregar em botões à sorte para fazer um horário. Se não fosse a ajuda de amigos meus não saberia ir à plataforma do “Sigarra” consultar o meu horário. Depois segue-se entre muitos outros episódios em que diversos docentes demonstram um relação fria com estudantes. Felizmente há excepções e hoje já estou perfeitamente habituado.
Por fim, salientar o facto que mudei de escola desde criança com alguma frequência, por isso tive de habituar-me sempre a fazer amigos novos, mas claro que me custou, passar a primeira semana sozinho no Porto, onde não conhecia ninguém e os meu amigos do ensino básico e secundário que eu conhecia melhor, entraram em outros cursos, noutras faculdades, noutras regiões do país. Acabei por passar à vontade uns bons dois dias sozinho, mas com naturalidade foi ganhando coragem e fui abordando pessoas. Procurando conhece-las melhores e formei bons amigos. Posso afirmar com toda a convicção que nas duas primeiras semanas fiz mais amigos graças a vir à faculdade treinar para ginástica, natação ou estudar para a biblioteca do que propriamente na praxe, em que apenas continuei a estabelecer contacto com duas no máximo três pessoas. Por fim, não posso deixar de salientar que conheci também o meu outro grande caro colega Pedro que é de Gondomar e também faz parte do grupo Psicologia a 3.

Eu e o judoca Nuno, a aproveitar o melhor da praxe.

João

Bem, eu tive duas entradas na universidade. A primeira encarei com o habitual nervosismo e muita expectativa, a segunda nem por isso.
Estávamos em meados de Setembro de 2013 e a praxe, o nível de exigência dos professores eram uns dos temas que mais mexiam com a minha cabeça. Claramente encontrava-me perante uma situação diferente, mas nada de extraordinário.
Naturalmente, as pessoas hiperbolizam toda a entrada na universidade e chegam mesmo a classificar esse primeiro ano como sendo o melhor das nossas vidas, mas eu não acredito em nada disso.
Não é que não seja fascinante até porque estamos numa situação nova, mas parece-me que existem situações e experiências que podemos fazer que são bem mais divertidas e estimulantes em comparação com o beber até cair, ser humilhado e ter que beber de novo até cair porque “estou a ser humilhado e gosto disso”. Não é vida para mim.
Quando entrei na Universidade do Minho, experimentei a praxe e gostei no sentido em que promove o convívio e cria um espírito de família, mas também consegui fazer isso sem ter que arrastar a minha cara pela lama. Se tiver que aconselhar alguém nesta área diria que ir ás aulas é bem mais preferível e ficar até mais tarde a trabalhar com o pessoal da tua turma é a “cereja no topo do bolo”.
No “pacote” praxe veio o “presente” das saídas á noite e para um jovem que nunca bebeu, acabavam-se SEMPRE por tornar desconfortáveis. É engraçado sair com os teus colegas e agires como crianças no recreio, mas facilmente se torna irritante com as constantes confrontações das outras pessoas: “Porque é que não bebes?”; “Tens a certeza que não queres beber?”; “Tu é que ficas a perder!”; O que tornava tudo ainda mais ridículo é que eles nem queriam saber das respostas ou os porquês de não beber, simplesmente, me rotulavam como diferente.

Eu, João, em mais um evento da praxe da Universidade do Minho.

Já relativamente aos professores confesso que fiquei extremamente admirado com o dinamismo e a interactividade. Remeteu-me um bocado para as relações entre os mestres e os aprendizados. Fluidez e solidariedade eram características evidentes na nossa pequena turma e os professores tinham muitas vezes um papel decisivo na conjugação de todas as personalidades para formar uma pequena família.

As aulas de Desenho de Design de Produto. Informalidade era uma característica normal, mas a proximidade da turma era extraordinária.

A segunda entrada deu-se quando entrei na Universidade do Porto. Já vinha com outra “estaleca”, não entrei na praxe, dei tempo ao tempo e acabei por criar o meu núcleo de amigos (aos quais incluo o Pedro e o Tiago). Com os professores decidi ser mais brando, já que neste curso são cerca de 70 pessoas por aula e manter o controlo e ao mesmo tempo dinamismo será bem mais difícil.
Se tivesse que optar uma como sendo a mais marcante, diria que seria a entrada na Universidade do Minho, graças ao factor novidade, mas se tivesse que escolher uma mais calma e positiva, diria que a entrada na Universidade do Porto ganha com uma margem bem larga.

 Pedro

Confesso que a decisão de vir para a o curso de desporto é algo que ainda hoje não tenho explicações totalmente credíveis, mas vou tentar explicá-lo com este texto. Quando escrevemos, as coisas parecem sempre mais verosímeis, vejamos se funciona…
Primeiro, as notas pareciam ser as suficientes para entrar na FADEUP com relativa facilidade, dito isto já convencia alguns. Segundo, sempre estive ligado ao desporto. Fiz natação, futsal e a actividade desportiva foi algo que nunca me amedrontou, por isso, também se aceitava este argumento. Terceiro, da dispersão de assuntos que me interessavam, desporto era um deles. As perspectivas no seio familiar eram outras, mas eu sempre fui um rapaz do contra.
Ainda hoje é muito difícil dizer uma disciplina que realmente goste. Digamos que dentro de cada disciplina existem assuntos que me despertam curiosidade e para tudo resto o meu esforço é basicamente nulo.
Posto isto, sem saber o que optar vim para o que o meu rato clicou. Digo isto com sinceridade, ainda hoje tenho as minhas dúvidas se optei pelo mais certo. Mas a vida é assim, às vezes temos de bater com a cabeça para sabermos se erramos. Se bater com a cabeça cá estarei para emendar o que fiz mal. Até lá… Até lá, dou o meu melhor.

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